quinta-feira, 30 de julho de 2009

Diário de uma médica sem fronteiras



Esta psiquiatra trocou a vida que levava em São Paulo pelo perigo - e se encontrou. Há dois anos, Carla Kamitsuji trabalha com populações vitimadas pela violência, que passam fome, enfrentam epidemias, a angústia, a depressão e as recorrentes ameaças de exércitos em guerra

Patrícia Zaidan
Revista Claudia – 05/2009

Em 2007, a psiquiatra Carla Kamitsuji, 32 anos, fechou o consultório em São Paulo, pediu demissão de três empregos, trocou os sapatos por tênis e partiu para Uganda, na África, em sua primeira missão em Médicos sem Fronteiras (MSF), organização humanitária internacional presente em mais de 70 países. Desde o grave acidente de carro que sofrera, aos 25 anos, por ter dormido ao volante, questionava sua rotina turbulenta e cheia de plantões. Não via sentido naquilo. Bem o oposto do que sente hoje ajudando a restaurar a vida de pessoas em meio a guerras, doenças, violência social e catástrofes naturais.

Depois de Uganda, Carla passou pelo Iraque e no momento está na Cisjordânia. Com a família, ela se comunica duas vezes por mês pelo Skype e, num único e-mail mensal, dá notícias a todos os amigos. A psiquiatra não tem namorado, filhos nem planos para tanto. Uma médica pode se casar durante a missão, mas, se ela engravidar em áreas endêmicas, terá de abandonar o trabalho para não oferecer riscos ao bebê.

A aridez da missão faz a psiquiatra se perguntar, constantemente, por que escolheu esse caminho. "Sei que o trabalhador humanitário está mais sujeito a infecção por HIV; sofre de solidão e stress cumulativo por ficar longe de casa, da língua nativa; enfrenta, às vezes, alojamentos sem energia elétrica, tomando banho de balde. Tudo isso o torna mais suscetível ao suicídio e ao abuso de álcool e drogas", reflete. "Mesmo assim, a resposta é clara: minha vocação é estar no mundo, entre as pessoas que têm as demandas mais agudas e urgentes. É desse modo que resolvo os meus conflitos internos e me sinto realmente feliz."

CISJORDÂNIA

No fim de 2008, o conflito entre Israel e a Faixa de Gaza se intensificou: o Exército israelense bombardeou o local para cercear o lançamento de foguetes do Hamas, o grupo radical islâmico que controla a área. Em janeiro, o saldo de mortos em Gaza chegou a 700, e o de feridos a 2,5 mil. O reflexo do pavor se estendeu à vizinha Cisjordânia, outro território palestino sob ocupação de Israel. Carla chegou a Hebron, na Cisjordânia, em 23 de janeiro de 2009 e permanecerá lá até outubro.



Quando me instalei, a cidade respirava sob um cessar-fogo. As pessoas têm medo de que o próximo alvo de bombas seja a Cisjordânia. Durante a guerra, a população passava o dia vendo os ataques na TV Al Jazeera. Não há um só árabe aqui que não tenha parentes em Gaza. Tratamos sintomas depressivos, ansiedade e pânico com técnicas da terapia cognitiva comportamental e da arte-terapia em até 12 encontros. Se há necessidade de remédio, encaminhamos para o centro de saúde mental do governo.

As crianças são as mais afetadas. Elas não querem dormir sozinhas e relatam sonhos terríveis. Uma menina cobriu suas bonecas alegando que elas não podiam mais brincar porque haviam morrido como os moradores de Gaza. Outra, de 12 anos, foi atingida por uma bala de borracha perdida, disparada por soldados israelenses no contra-ataque a garotos que atiravam pedras. Ela sofreu de insônia por 15 dias. Num outro episódio, um rapaz de 16 anos, que também atirava pedras, acabou preso. A mãe, angustiada com a prisão, perdeu o apetite, o ânimo e a concentração. Após três sessões individuais, ela apresentou melhoras. Um jovem de 18 anos, que se recusou a ficar de pé em posição de revista, tomou um tiro nas costas e teve o pulmão e duas vértebras afetados. Relata dores, falta de ar e sentimento de morte.

Eu também me cuido: uma vez por mês vou a Jerusalém para supervisão técnica e suporte psicológico com a nossa equipe. O desabafo me ajuda a administrar o impacto dos casos que ouço e a manter o equilíbrio.

Como a maioria dos atendimentos é domiciliar, passo muito tempo fora do escritório, com um motorista e uma tradutora. De folga na sexta e no sábado, posso dirigir e andar pelas ruas. Hebron é bonita e tem frutas e verduras variadas, roupas, eletroeletrônicos. As mulheres andam de véu e saia longa; as estrangeiras podem usar manga curta e saia abaixo dos joelhos. Sempre ouço a palavra salamalekum, que significa "a paz sobre você". Mas o retrato do momento, para mim, é o muro que separa palestinos e israelenses - tanto o de concreto quanto o abstrato, bem mais difícil de ser compreendido.

UGANDA

O Exército de Resistência do Senhor (LRA), de orientação fundamentalista cristã, tenta derrubar o presidente Yoweri Museveni, que está no poder desde 1986 e reage com pesados ataques. Depois de 22 anos de guerra civil, vigora no momento uma trégua, mas a população teme o LRA, que sequestra garotos e os transforma em soldados e faz das meninas escravas sexuais. Carla ficou no país de 16 de janeiro de 2007 a 7 de outubro do mesmo ano.

Em Attiak, no norte de Uganda, as pessoas vivem em campos de refugiados internos. Elas não voltam para casa com medo dos ataques do Exército oficial e do LRA - qualquer cidadão fora dos campos é considerado inimigo. As famílias ocupam tukuls (oca de tijolo e argila coberta com palha) e o acesso aos serviços básicos é precário. Minha missão era implantar um programa de saúde mental e mostrar que bem-estar envolve curtir os amigos e o trabalho, equacionar problemas e sentir-se livre.

Uganda me marcou pela riqueza do contato humano. As crianças se apegavam, queriam brincar, me chamavam de mono, que quer dizer branca. Me lembro bem de um domingo gostoso, quando almocei na casa de uma colaboradora da equipe. Sentamos no chão - não se usa mesa na região - e foram servidas as cumbucas. Não há faca nem garfo, comemos com as mãos. Também me surpreendi com o 8 de março: no Dia Internacional da Mulher ninguém trabalha, é feriado.

IRAQUE

Os Estados Unidos invadiram o Iraque em 2003 e derrubaram o ditador Saddam Hussein, que ficou 24 anos no poder. Tropas americanas com 100 mil homens continuam no país, marcado por inúmeros atentados que atingiram a população civil. A psiquiatra Carla Kamitsuji trabalhou no Iraque de 17 de fevereiro a 26 de junho de 2008.

Vivi entre Erbil e Dohuk, que não estão na zona de guerra explícita, mas sofreram explosões em 2007. A tensão emocional é relatada por todos os pacientes - seja em consequência da guerra contra o Irã (de 1980 a 1988), da opressão do regime de Saddam Hussein ou da invasão americana. A maioria dos casos, porém, era de mulheres queimadas. No mundo ocidental, as pessoas interrompem a vida ingerindo remédios. Lá, ateiam fogo no corpo.

Em Erbil, trabalhei em um hospital de emergência. Não esqueço uma mulher de 20 anos, forçada a casar com um primo. Sem ver saída, incendiou as roupas. Os curativos eram feitos sem morfina, e ela se mantinha calada. Outra teve um caso com o cunhado, o marido descobriu e a polícia entrou no meio: adultério é crime. Assim que ela recebeu alta, o marido a matou.

Já em Dohuk, participei de um projeto com deslocados internos vindos de Bagdá, Mosul e Kirkuk. Eram todos curdos e preferiam morar em barracas a se expor aos ataques xiitas ou sunitas. Fazíamos visitas domiciliares para detectar a necessidade de ajuda. Encontrei casos como o de uma adolescente que ficou apática, sem fala, depois que o pai tirou seu celular para que esquecesse a escola e os amigos que deixara para trás e se acostumasse com a realidade de refugiada.

Também foi marcante o caso da viúva de um soldado assassinado em Mosul, obrigada a abandonar a casa às pressas para não ser morta com a família. Ela apresentava transtorno de humor, chorava muito e batia nos filhos. Um dia, tentou o suicídio eletrocutando-se. Seu caso só se resolveu quando a terapeuta mostrou a foto do marido e ela, finalmente, pode se despedir dele - o que não fizera por causa da fuga da cidade. A partir daí, respondeu melhor ao tratamento e aprendeu a controlar a raiva que a fazia bater nos filhos.



Houve momentos leves, entre pessoas que queriam mostrar as belezas do país e me convidavam para visitá-las. Mas eu ficava em casa nas folgas, presa às regras de segurança. O responsável pela logística do grupo precisava ser informado de cada passo, era impossível sair a pé sozinha e sem rádio de comunicação. Fazer visitas, só com autorização: a ausência de mais de uma hora podia significar sequestro. Namorar um iraquiano, nem pensar. Os bairros com grande circulação de estrangeiros eram vetados por serem alvos de bombardeios. Eu me sentia confinada e cheguei a desenvolver sintomas de depressão. Os colegas não sabiam o que fazer. Médicos são pragmáticos, lidam com malária, ossos quebrados, mas, diante da solidão, sentem-se impotentes - ou preferem ignorar que temos fraquezas. Apesar disso, o saldo da experiência foi positivo.

domingo, 19 de julho de 2009

A inclusão que ensina


Matheus Santana da Silva, 14 anos, autista, estuda numa turma regular de escola pública em São Paulo desde a 1ª série. A história dele é a prova de que, apesar das dificuldades, incluir crianças com necessidades especiais beneficia todos

Daniela Talamoni Verotti e Jeanne Callegaria
Especial inclusão/Revista Nova Escola - 07/2009

“Matheus chegou para mim na 1ª série. Eu tinha 42 alunos, e ele já estava com 7 anos completos e só falava o próprio nome. Era agressivo, agitado e não queria ficar na sala. Eu não fazia ideia do que era autismo. Então, no primeiro dia de aula, foi uma surpresa.”

O relato é da professora Hellen Beatriz Figueiredo, da rede pública municipal de São Paulo, mas poderia ser de um educador de qualquer sala de aula do Brasil. Desde 2008, a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva determina que todos os alunos com necessidades educacionais especiais sejam matriculados em turmas regulares. A Educação Especial passou a ser oferecida apenas como um complemento no contraturno. Na prática, isso significou a matrícula só no ano passado de 375.775 alunos com deficiência em salas regulares, regidas por educadores que, muitas vezes, não se sentem preparados para lidar com a situação. Exatamente como aconteceu com Hellen em 2003, quando acolheu Matheus Santana da Silva. Naquele tempo, apesar de a lei determinar a inclusão, imperava uma visão integracionista. Uma criança com deficiência só permanecia numa sala regular se acompanhasse o ritmo da turma.

Hellen poderia ter alegado que Matheus não aprendia como os demais. Seria mais fácil desistir do aluno autista que fugia da sala a toda hora, mas ela escolheu o caminho mais difícil, o de incluí-lo. Ambos saíram ganhando. Hoje, aos 14 anos, Matheus cursa a 7ª série na EMEF Coronel Hélio Franco Chaves, na capital paulista. Adora ler, resolve expressões matemáticas com letras e números e navega na internet. Tem muitos amigos e aprendeu o significado de emoções como orgulho e felicidade – uma vitória para um autista. Hellen, por seu lado, fez vários cursos sobre autismo, escreveu sua monografia da graduação em Pedagogia sobre inclusão e hoje integra a Diretoria de Educação de um dos Centros de Formação e Acompanhamento à Inclusão (Cefai) da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo. A história dos dois simboliza a mudança de mentalidade já em curso em muitas escolas públicas e particulares espalhadas pelo país.

ROMPER COM AS VELHAS IDEIAS

Durante séculos, o mundo tratou as crianças com deficiência como doentes que precisavam de atendimento médico, não de Educação. Essa perspectiva começou a mudar na década de 1950 (veja a linha do tempo abaixo e nas próximas páginas). Mas foi só nos anos 1990 que as velhas ideias assistenciais foram suplantadas pela tese da inclusão. Procurava-se garantir o acesso de todos à Educação. Documentos como a Declaração Mundial de Educação para Todos, de 1990, e a Declaração de Salamanca, de 1994, são marcos desse movimento. O rompimento com práticas e conceitos antigos marcou também o início do trabalho de Hellen. Ela sabia que precisaria inovar se quisesse que Matheus aprendesse. E o primeiro desafio era mantê-lo em sala. “Passei a iniciar as aulas do lado de fora. Todos os dias eu cantava, lia histórias ou sugeria alguma atividade que estimulasse a alfabetização ou outro aprendizado”, lembra. “Era uma forma de ensinar o conteúdo, promover a integração entre as crianças e atrair o Matheus para a classe.”

Para lidar com as fugas repentinas para o bebedouro – onde Matheus se acalmava mexendo na água –, a professora ensinou-o a pedir para sair. Mostrava, a cada fuga, que ele podia bater com a caneca na carteira quando quisesse beber água. “Um dia, ele bateu a caneca e permaneceu sentado, esperando a minha reação”, conta a professora Hellen. “Percebi que ele tinha aprendido.” Para a psicopedagoga Daniela Alonso, consultora na área de inclusão e selecionadora do Prêmio Victor Civita – Educador Nota 10, Hellen acertou em cheio: “Pensar nas diferenças implica oferecer variadas intervenções. Os caminhos da inclusão para atender à diversidade costumam sempre beneficiar todos e melhorar a qualidade do ensino”.

Antes de entrar na escola em que está até hoje, Matheus rodou por três outras sem se encontrar. Na primeira, particular, a direção não soube lidar com ele. A mãe, Lindinalva Santana, tentou uma escola especial, mas em pouco tempo concluiu que o filho não estava aprendendo. Partiu para a matrícula numa EMEI indicada pela fonoaudióloga que atende Matheus desde pequeno. Diante do histórico apresentado quando Matheus chegou à escola de Ensino Fundamental, Hellen imaginou que ele poderia ter aprendido alguma coisa. “Eu o observava durante as aulas de leitura e o jeito como ele manuseava o livro, mexia a boca e colocava os dedos sobre as palavras e frases me fez perceber que ele sabia ler.” Como o garoto não falava, Hellen encontrou um meio de testá-lo. “Escrevi com letra bastão em tiras de papel o nome de dez objetos. Misturei todas e pedi que ele pegasse só a que correspondia ao objeto que eu citava.” Na primeira tentativa, Matheus não prestou atenção e pegou qualquer palavra. Hellen insistiu e ele acertou. “Achei que pudesse ser coincidência e continuei, inclusive com frases inteiras, e ele acertou tudo. Depois disso, não dei mais sossego para o Matheus”, lembra a professora. Daniela Alonso diz que descobrir as competências dos estudantes é o caminho. “Antes, focávamos as dificuldades. O professor queria checar o que eles não sabiam, valorizando as diferenças pelas ‘falhas’. Hoje, devemos sondar o que cada um conhece para determinar como pode contribuir com o coletivo”, explica.

Matheus deixou para trás a trajetória errante na Educação Especial, seguindo o mesmo caminho das políticas públicas brasileiras. O país apostou, em 2001, na inclusão. Nesse ano, começou a ser divulgada a lei aprovada em 1989 e regulamentada em 1999 que obrigava as escolas a aceitar as matrículas de crianças com necessidades especiais e transformava em crime a recusa a esse direito. Desde então, começou a aumentar o número de estudantes com deficiência nas salas regulares. De 81.344 naquele ano, ele saltou para 110.704 em 2002 e nunca mais parou de crescer. O Brasil, porém, estava ainda longe de assumir a inclusão como um fato consumado. As salas especiais eram muito mais numerosas, com 323.399 matrículas em 2001 e 337.897 em 2002.

A história da Educação Especial no Brasil

MEIOS DE LEVAR O ALUNO A APRENDER
As salas especiais se mantiveram porque os professores não se achavam preparados, as escolas não tinham a estrutura necessária e os grupos de defesa dos direitos das pessoas com deficiência duvidavam da inclusão. Até que, em 2008, após anos de debates, a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva acabou com a escolha entre ensino regular e especial (leia o quadro na página ao lado). A nova política começou a mudar os padrões ao definir com clareza como deve ser oferecida a Educação para todos os que têm deficiência. Não por acaso, nesse mesmo ano, pela primeira vez, o número de alunos com necessidades especiais no ensino regular superou o de matriculados em salas especiais (veja o gráfico na página seguinte).

Na sala da professora Hellen, o desafio no primeiro ano de Matheus era outro: mudar o padrão de comportamento do aluno autista que insistia em não se comunicar com ninguém. Ele sabia ler e precisava falar, se expressar. Assim como fazia com toda a turma, Hellen o incentivava a ler as histórias e conversar sobre elas. No início, o garoto apenas repetia respostas e isso já era uma vitória. Mas ela queria que Matheus se comunicasse espontaneamente. Durante a chamada, a professora Hellen sempre fazia uma pausa após o nome dele, na esperança de ouvir a resposta.
Nada acontecia. Até que um dia, para a surpresa de todos, ele disse “presente”. “A turma inteira bateu palmas. A partir desse momento, ele começou a se comunicar, a dizer o que queria.”

Graças à conquista da comunicação, Hellen passou a contar cada vez mais com a participação de Matheus. Assim, descobriu outras possibilidades, estudou, trocou experiências com colegas, observou e avaliou a interação do menino com as propostas que fazia e, assim, organizou diferentes atividades para que ele pudesse aprender ainda mais. No fim da 1ª série, Matheus já escrevia, ainda que tivesse dificuldade para controlar o tamanho da letra. No ano seguinte, porém, vários colegas com quem Matheus estudava saíram da sala. A nova professora também não se sentia segura para incluir o aluno. Matheus se sentiu perdido e regrediu. Parou de ler e de escrever, voltou a ser agressivo e a abandonar a sala de aula. Em lugar de ir para o bebedouro, porém, ele se refugiava na turma de Hellen. Aquela professora da 2ª série sofria com as mesmas dúvidas que até hoje desanimam muitos colegas (conheça, no quadro da página seguinte, programas de formação na área).

POR QUE INCLUIR?
Será que as crianças com deficiência não aprendem mais em classes separadas, com professores especializados e dedicados apenas às necessidades delas? Quem responde é Maria Teresa Eglér Mantoan, docente da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e uma das pioneiras no estudo da inclusão no Brasil: “A escola regular é mais desafiadora e um ambiente desafiador é mais propício ao aprendizado”. Não apenas as crianças com deficiência são mais desafiadas. Os outros alunos também ganham muito com a inclusão. A flexibilização de recursos pode ajudar todos a aprender mais. Se o educador utiliza um modelo em 3D para ensinar o Sistema Solar, por exemplo, não só os que têm deficiência auditiva avançam mais mas também toda a classe tem acesso a um recurso que facilita a compreensão do conteúdo. “O professor que está preparado para a inclusão está preparado para atender todas as crianças”, diz Cláudia Pereira Dutra, secretária de Educação Especial do Ministério da Educação (MEC). “A inclusão obriga o sistema educacional a se repensar, a descobrir novas formas de ensinar”, completa Maria Teresa. “Muda o entendimento do que é aprendizagem.”

Ensino regular X Educação Especial

NOVAS POSTURAS, NOVAS APRENDIZAGENS
O histórico da inclusão de Matheus obrigou a EMEF Coronel Hélio Franco Chaves a se repensar. Depois dos avanços na 1ª série e dos retrocessos na 2ª, a direção da escola tomou uma decisão: a partir daquele ano, a turma de Matheus o acompanharia até o fim do Ensino Fundamental. A então professora da 3ª série, Márcia Maria Batista Martinelli, por sua vez, assumiu a responsabilidade por recuperar os avanços que Matheus já havia conquistado. Ela e Hellen conversavam diariamente sobre possíveis flexibilizações. Como Hellen ocupava a mesma sala em período diferente, Márcia às vezes deixava recados no quadro para a colega. Certo dia, ela flagrou Matheus lendo um desses bilhetes e descobriu como incentivá-lo a escrever novamente: mandar cartas para a antiga professora. Na primeira, Matheus escreveu: “Oi, estou na 3ª série com a professora Márcia”. No dia seguinte, ele encontrou a resposta de Hellen, que estrategicamente questionava o que ele estava aprendendo. A troca de mensagens se intensificou e Matheus nunca mais deixou de escrever. Márcia também aproveitou a grande capacidade de memorização – ele sabe as letras e os números da placa do carro de todos os professores – para ensinar operações matemáticas. Na aula de Geografia, certa vez, usou uma viagem que o garoto faria com os pais para Pernambuco para ensiná-lo a utilizar o mapa. Assim, aproveitando o potencial dele a cada descoberta, Márcia foi a segunda professora a fazer diferença na vida do jovem. Hoje na 7ª série, o menino autista não se incomoda com o vaivém de professores.

Dentro de suas capacidades, participa de tudo, mesmo que o conteúdo nem sempre seja o mesmo abordado com o restante da turma. “Para o aluno com necessidades educacionais especiais, não há necessariamente aprendizagem em série. Ele pode estar integrado com o grupo em alguns aspectos do desenvolvimento e necessitar de outras estratégias”, explica Daniela Alonso. A mãe de Matheus, que todos os professores não se cansam de elogiar pela sólida aliança com a escola, sempre soube que o filho se sairia bem. Uma das maiores emoções da vida dela foi sentida durante uma festa de Dia das Mães, quando ele recitou uma poesia na frente de todos os convidados na escola. “Por causa das dificuldades que tem na fala, eu não consegui entender muita coisa, mas ver meu filho ali, lendo aquele texto em voz alta ao microfone, foi meu melhor presente”, afirma Lindinalva.

PARA APRENDER A INCLUIR:

Programa Educação Inclusiva: Direito à Diversidade
O que é: Formação de professores para disseminar a Educação Inclusiva. Profissionais dos chamados municípios-polo são treinados e atuam como multiplicadores em sua cidade.
O que já fez: Cursos em 162 municípios-polo, com a formação, em 2008, de 12.708 professores.

Programa de Formação Continuada de Professores na Educação Especial
O que é: Especialização, extensão ou aperfeiçoamento para educadores da rede pública.
O que já fez: Cursos para 8,5 mil professores, em 2008, ministrados em 18 instituições públicas de ensino superior.

Programa de Implantação de Salas de Recursos Multifuncionais
O que é: Distribuição de materiais pedagógicos e equipamentos para atendimento especializado.
O que já fez: Criou, entre 2005e 2008, 5.551 salas de recursos.

Programa Escola Acessível
O que é: Distribuição de recursos para a adequação de escolas.
O que já fez: Investiu 30,8 milhões de reais em 2007 e 2008 para a adaptação de edifícios.

O NOVO PAPEL DA EDUCAÇÃO ESPECIAL
A nova política nacional para a Educação Especial é taxativa:
todas as crianças e jovens com necessidades especiais devem estudar na escola regular. Desaparecem, portanto, as escolas e classes segregadas. O atendimento especializado continua existindo apenas no turno oposto. É o que define o Decreto 6.571, de setembro de 2008. O prazo para que todos os municípios se ajustem às novas regras vai até o fim de 2010.

O texto não acaba com as instituições especializadas no ensino dos que têm deficiência. Em lugar de substituir, elas passam a auxiliar a escola regular, firmando parcerias para oferecer atendimento especializado no contraturno. Na prática, muda radicalmente a função do docente dessa área. Antes especialista em uma deficiência, ele agora precisa ter uma formação mais ampla. “Ele deve elaborar um plano educacional especializado para cada estudante, com o objetivo de diminuir as barreiras específicas de todos eles”, diz Maria Teresa Eglér Mantoan, professora da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e uma das pioneiras nos estudos sobre inclusão no Brasil.

Ensinar os conteúdos das disciplinas passa a ser tarefa do ensino regular, e o profissional da Educação Especial fica na sala de recursos para dar apoio com estratégias e recursos que facilitem a aprendizagem. É ele quem se certifica, ainda, de que os recursos que preparou estão sendo usados corretamente. “Ele informa a escola sobre os materiais a serem adquiridos e busca parcerias externas para concretizar seu trabalho”, afirma Maria Teresa. A princípio, esse educador não precisa saber tudo sobre todas as deficiências.

Vai se atualizar e aprender conforme o caso. Ele pode atuar na sala comum de longe, observando se o material está sendo corretamente usado, ou estender os recursos para toda a turma, ensinando a língua brasileira de sinais (Libras), por exemplo. Quem souber se adaptar não correrá o risco de perder espaço. “O profissional maleável é bem-vindo”, garante Maria Teresa. O momento atual é de construção. De fato, a inclusão na sala de aula está sendo aprendida no dia a dia, com a experiência de cada professor. “Mas não existe formação dissociada da prática. Estamos aprendendo ao fazer”, avalia Cláudia Pereira Dutra, secretária de Educação Especial do Ministério da Educação (MEC).

Matéria extraída do site: http://planetasustentavel.abril.com.br/noticia/educacao/conteudo_483681.shtml?func=2

quinta-feira, 16 de julho de 2009

Institutos Alpargatas e Camargo Corrêa levam bibliotecas a mais de 50 mil alunos da Paraíba


Entre os títulos, serão disponibilizados clássicos da literatura infantil e infanto-juvenil, além de obras da literatura portuguesa.

Os Institutos Alpargatas e Camargo Corrêa levam a biblioteca à sala de aula em seis municípios da Paraíba. Ocorreu, no último dia 7, a primeira entrega de livros do projeto Pró-Biblioteca, uma parceria entre os institutos e a editora L&PM. A cidade escolhida para estrear a iniciativa é Serra Redonda, distante 104 quilômetros da capital, João Pessoa. O programa é patrocinado pela Lei Rouanet.

O Pró-Biblioteca vai contemplar as 19 escolas municipais de Serra Redonda. Até novembro, outras 255 escolas recebem a biblioteca, cujo formato, móvel com rodinhas, permite que seja transportada a todas as salas de aula. As outras cinco cidades contempladas serão Mogeiro, Ingá, Guarabira, Alagoa Nova e Campina Grande. Idealizado pela Associação Rio-Grandense de Bibliotecários, o projeto foi modificado pelo Instituto Camargo Corrêa e ganhou novas ações para se adequar à realidade das escolas públicas da Paraíba, onde os institutos Alpargatas e Camargo Corrêa desenvolvem um programa de melhoria da gestão de escolas públicas, o Escola Ideal.

“Realizamos um diagnóstico da situação das escolas nestes municípios e uma das necessidades apontadas foi a instalação de bibliotecas”, explica Francisco Azevedo, diretor-executivo do Instituto Camargo Corrêa. A implantação do projeto conta com parceria da Secretaria de Educação dos municípios envolvidos e funcionários voluntários das unidades locais da Alpargatas.

Além de valorizar a leitura nas escolas, o projeto também pretende incentivar a comunidade a ler. Para isto, o programa prevê a capacitação de 80 profissionais, que atuarão como divulgadores das bibliotecas no entorno das escolas. “Queremos, por meio do projeto, estimular o gosto pela leitura não só entre os estudantes, mas na população como um todo”, afirma Berivaldo Araújo, diretor executivo do Instituto Alpargatas.

As mais de 40 mil obras que começam a ser disponibilizadas contemplam clássicos brasileiros e portugueses, leituras de interesse geral, livros infantis e infanto-juvenis. O lançamento do programa acontecerá no Grupo Escolar Eduardo Medeiros, com a participação da comunidade local.

Escola Ideal

O Pró-Biblioteca é mais uma ação do Programa Escola Ideal, cujo objetivo é contribuir para o aprimoramento da gestão de escolas públicas. Também fazem parte da iniciativa os projetos Juntos pela Escola Ideal que, em sistema de mutirão, já reformou 28 escolas na Paraíba, e Produção Agroecológica Integrada e Sustentável (PAIS), cuja tecnologia permite o cultivo de hortaliças orgânicas.

O programa teve início em março de 2008, quando as escolas participantes passaram por uma auto-avaliação abordando seis temas: profissionais da educação, condições de ensino, políticas e práticas pedagógicas, desempenho escolar, ambiente educativo e gestão escolar.

A análise dos dados permitiu identificar as necessidades e as potencialidades das escolas. A partir deste ponto foram estabelecidas, junto às secretarias de educação, iniciativas, como o Pró-Biblioteca, que visam o aprimoramento da gestão do ensino público.

Sobre o Instituto Alpargatas

O Instituto Alpargatas tem como missão melhorar a qualidade educacional de crianças e adolescentes das comunidades onde a empresa está presente. Este ano, o IA comemora seu sexto aniversário, com atuação marcante nos municípios de João Pessoa, Santa Rita e Campina Grande, na Paraíba, de Natal, no Rio Grande do Norte, e de Carpina, em Pernambuco. Seu principal projeto - Educação Por Meio do Esporte - envolve as iniciativas Ação Escola, que utiliza a prática esportiva como instrumento metodológico para a melhoria da educação, durante o horário escolar; Ação Pós-Escola, no qual os alunos dedicam-se a modalidades esportivas monitoradas, fora do horário regular das aulas; e apoio financeiro para melhoria de quadras esportivas.

Sobre o Instituto Camargo Corrêa

O Instituto Camargo Corrêa, criado em dezembro de 2000, é o responsável pelos investimentos sociais do grupo. Sua missão é promover o desenvolvimento comunitário sustentável, investindo em crianças, adolescentes e jovens. Para tanto, criou quatro programas: o Infância Ideal, cujo objetivo é contribuir para o desenvolvimento saudável de crianças de 0 a 6 anos; o Escola Ideal, que trabalha pela melhoria da qualidade de gestão da escola pública; o Futuro Ideal, voltado para o empreendedorismo juvenil e geração de trabalho e renda; e o Ideal Voluntário, que facilita a ação voluntária dos profissionais do Grupo Camargo Corrêa.

Para mais informações, favor entrar em contato com: Cristina em camargonaweb@mail.com

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Generosidade para todos


Não é preciso ser Gandhi ou Madre Teresa para fazer o bem aos outros. As pequenas doações do dia a dia contam, e muito, para ajudar o próximo e fazer deste planeta um lugar melhor

Jeanne Callegari
Revista Vida Simples – 07/2009

O dia 22 de abril de 2009 tinha tudo para ser mais uma jornada comum na vida de Santiago Gori, taxista argentino de 49 anos. Por volta das 21h, ele pegou uma corrida de quatro quarteirões e deixou um casal de aposentados em seu destino, na cidade de La Plata, a 60 km de Buenos Aires. "Mais uma corrida ruim", pensou ele. Em seguida, pegou outra passageira, que o avisou que havia uma mala no banco de trás. Após deixá-la em seu destino, Santiago abriu a maleta e viu um monte de dinheiro - mais precisamente, 130 mil pesos, o equivalente a 72 mil reais. "Mas isso não é meu", disse. Seu próximo passo foi devolver a pequena fortuna aos verdadeiros donos, o casal que ele tinha transportado antes. Sensibilizados pela história de Santiago, que recebeu dos donos da mala, em retribuição, apenas um singelo "você é um santo", dois publicitários criaram uma campanha para arrecadar para o taxista a mesma quantia devolvida por ele. A iniciativa foi um sucesso e Santiago, o taxista generoso, levou o equivalente a 130 mil pesos.

Santiago não é um homem rico, como Bill Gates. Não fundou, como o empresário, uma associação milionária para patrocinar avanços em saúde e educação. Também não é, como Madre Teresa ou Gandhi, um líder religioso, que dedica sua vida a cuidar dos desfavorecidos. Santiago é um homem comum, humilde, que teve uma oportunidade de fazer a coisa certa e a aproveitou. Em tempos de crise mundial, em que todos se preocupam com o futuro de suas finanças, ele poderia ter ficado com o dinheiro; poderia tê-lo usado para pagar o que faltava da licença de seu táxi, ou para comprar coisas bonitas para sua esposa ou seus filhos. Mas ele foi direto até os donos entregar o que tinham perdido.

A história de Santiago prova que não é necessário ter uma fortuna, índole de santo ou algum poder para fazer o bem. Também não é preciso esperar grandes tragédias se abaterem sobre a população, como as enchentes de Santa Catarina e o furacão Katrina. Oportunidades para praticar a generosidade aparecem para todos nós, todo dia. Muitas vezes as desperdiçamos, por achar que temos quase nada a oferecer. Valorizamos e exaltamos a generosidade, mas achamos que ela é para poucos, para aquelas pessoas iluminadas que nasceram para fazer o bem. Nada poderia ser mais equivocado. Como disse o filósofo e político irlandês Edmund Burke, "ninguém comete erro maior que não fazer nada porque só pode fazer um pouco".

NOBREZA DE ALMA

Todos temos algo para dar. Pode ser dinheiro ou bens materiais, as associações mais comuns quando pensamos em generosidade. Mas também pode ser conhecimento, coisas que nós sabemos e que podem ajudar os outros. Pode ser um abraço, uma palavra de conforto, um carinho. Afinal, a generosidade é, antes de mais nada, uma inclinação do espírito para fazer o bem. A palavra vem do latim "generositas", que significa "de origem nobre". Com o tempo, passou a significar a nobreza não de nascimento, mas de espírito.

É esse espírito nobre, generoso, que encontramos em pessoas como dona Conchetta Viola. Aos 87 anos, ela é conhecida em sua vizinhança, no Rio de Janeiro, como uma pessoa de coração grande, que ajuda a quem precisa.

Seja fazendo um bolo para um vizinho, seja fazendo um mapa astral de graça, enquanto outros astrólogos cobram os olhos da cara pela leitura. "Tenho boa vontade", diz ela, quando pergunto sobre generosidade. Se alguém pede um favor, seja uma receita ou um bordado, dona Conchetta ajuda. Sempre sem cobrar nada. "Não tenho jeito de cobrar, o que vou fazer?", diz ela, rindo. "Aprendi com mamãe desde cedo a não fazer nada por interesse." Com a saúde frágil, tendo passado por algumas cirurgias, dona Conchetta diz que até precisaria de uma pensão melhor. Mas não se sente frustrada por ter ajudado a vida toda sem cobrar. "As pessoas me querem bem, tenho muitas amizades, meus filhos são muito carinhosos. A vida me retribuiu", diz.

Nos dias de hoje, parece cada vez mais difícil encontrar pessoas como dona Conchetta, capazes de se dedicar aos outros sem esperar recompensa. Mas, apesar de ter se tornado artigo raro, a generosidade foi responsável pela sobrevivência do ser humano como espécie. Lá nos primórdios, quando o homem ainda morava nas cavernas e caçava para sobreviver, era essencial que o grupo se mantivesse unido. Quem dava sorte na caçada distribuía carne para quem não tinha conseguido nada. Mais para a frente, a situação se invertia e quem tinha sido ajudado da primeira vez retribuía o favor, e assim ninguém passava fome. Os espertinhos que só queriam saber de aproveitar da caça dos outros, sem retribuir, eram logo excluídos do grupo. Esse comportamento é conhecido na sociobiologia como "altruísmo recíproco" e foi descrito pelo pesquisador americano Robert Trivers nos anos 70.

Nesse ponto, é bom fazer uma distinção entre altruísmo e generosidade. Segundo o filósofo e educador Mario Sergio Cortella, as duas virtudes são boas, mas diferentes. Agir esperando alguma espécie de retribuição seria altruísmo, representado no lema "faça aos outros o que querem que façam contigo". A generosidade seria a prática desinteressada, feita mesmo quando se sabe que não haverá recompensa, cujo mote é "faça o bem porque é bom fazer" Essa separação é útil do ponto de vista filosófico. Na prática, porém, de pouco serve. É desnecessário ficar pensando em quais foram suas motivações para ajudar o próximo. Ninguém precisa ficar se gabando porque doou dinheiro para uma entidade beneficente. Mas não é pecado se sentir bem depois de uma boa ação. Esse pensamento de que é errado sentir prazer ao doar serve para nos distanciar ainda mais da prática da generosidade. Sob esse ponto de vista, enquanto não tivermos razões 100% sinceras e desinteressadas para ajudar alguém, não vale a pena fazê-lo. E nossas razões nunca serão 100% puras, sinceras e desinteressadas, afinal, fazer o bem faz bem.

VIRTUDE CELEBRADA

Considerado o pai da filosofia e da matemática modernas, o pensador francês René Descartes também deu seus pitacos sobre a generosidade. Dela, dizia que é a consciência de ser livre e fazer bom uso dessa liberdade, ou seja, agir de forma virtuosa. Para ele, saber-se senhor dessa liberdade, e usá-la para ajudar os outros, fazia um bem danado para a pessoa, produzindo auto-estima.

"E é por gostar de si próprio que o generoso passa a estimar também o outro, reconhecendo nele o mesmo potencial para a virtude", diz o filósofo Jorge Quintas, que escreveu um trabalho acadêmico sobre a generosidade em Descartes. Um dos grandes psicanalistas da história, Donald Winnicott, foi ainda mais longe, afirmando que não conseguir doar pode fazer mal para a pessoa. Sem essa capacidade de se preocupar com o outro, ficamos desequilibrados, perdemos o sentido de viver.

"Clarice Lispector já disse: ‘Todos querem a liberdade, mas quem por ela trabalha?’", diz o cientista político Leo­nardo Sakamoto, fundador da ONG Repórter Brasil, que defende os direitos humanos. A organização ajudou a libertar trabalhadores da escravidão, denunciou a prostituição infantil e abusos cometidos contra comunidades ribeirinhas, entre outras atividades. Leonardo, que também dá aulas praticamente de graça para membros da comunidade e alunos da USP, nunca ganhou por seu trabalho na ONG. Atualmente, vive da bolsa concedida pela Ashoca, entidade que financia empreendedores sociais do mundo todo. "Levo uma vida modesta. Não estou aqui para ter o carro do ano. Nada contra quem tem, só que eu optei por uma vida menos confortável, mas que me realiza plenamente", diz ele.

Porém, a generosidade é uma virtude mais celebrada que praticada. "A generosidade só brilha, na maioria das vezes, por sua ausência", escreveu o filósofo francês Comte-Sponville no livro Pequeno Tratado das Grandes Virtudes.

Se a generosidade se tornou artigo raro, um pouco da culpa é da sociedade atual, calcada em valores como egoísmo e individualismo. "Pensamos muito em nosso próprio umbigo e pouco no dos outros", diz Mario Sergio Cortella. Para ele, isso é ainda mais forte nas classes mais altas. "Na favela, se desaba um barraco, a vizinha acolhe os filhos da que perdeu a casa, dizendo ‘onde comem dez comem 15’. Na classe média, às vezes as pessoas nem sabem o que fazer com os pais idosos", diz. Isso acontece porque, nas favelas, ainda impera o espírito de cooperação que guiou nossos antepassados na época das cavernas. Sem a ajuda do vizinho, não se sobrevive.

"Eu diria que o termo correto é disponível", afirma a geógrafa paulistana Flora Medeiros Lahuerta, de 26 anos. Ela é aquela pessoa a quem todos recorrem em momentos de necessidade. Seja para desabafar as desilusões amorosas, seja para dar carona ou revisar um texto acadêmico. Certa vez, uma amiga saiu do Rio de Janeiro sem roupas apropriadas para enfrentar o frio cortante que fazia em São Paulo. Do meio da estrada, ligou para Flora, que saiu de uma festa para buscá-la na rodoviária, casaquinho e cachecol na mão. O grande desafio de Flora, agora, é calibrar melhor o tempo que dedica aos outros. Afinal, de tanto querer agradar a todos, acaba se atrapalhando e assumindo tarefas que não conseguirá cumprir. "Para mim não é um esforço ajudar", diz. "Sinto satisfação ao ver que contribuí para que algo desse certo."

EDUCAR PARA DIVIDIR

Um dos mecanismos que a sociedade sempre teve para educar para o bem foram as religiões. Como sempre foram preocupadas com a moral, as crenças em um poder superior costumam estimular virtudes como a generosidade, a solidariedade, a compaixão. "Ninguém nasce generoso", diz o reverendo Alderi Sousa de Matos, professor de História da Igreja do Centro Presbiteriano de Pós-Graduação Andrew Jumper, da Universidade Mackenzie. "É preciso aprender." No cristianismo, por exemplo, costumam-se contar as histórias de Cristo como inspiração para os fiéis. Uma das mais conhecidas é a do milagre da multiplicação de pães e peixes. "O que Cristo fez foi juntar o pouquinho que cada um tinha e repartir entre todos", diz Cortella. Aí está a diferença entre dividir e repartir. "Quando se divide um bolo entre dez pessoas, cada uma fica com um pedaço. Quando se reparte o bolo, cada uma fica com o que precisa", exemplifica. Para o budismo, exercitar todos os dias virtudes como a generosidade é uma forma de combater os vícios, como o egoísmo.

Como as religiões forçam o indivíduo a olhar para fora de seu próprio mundo, são uma forma de se educar para a generosidade. Mas não são as únicas. Existem práticas que podem ser feitas nas escolas, por exemplo, para estimular as crianças a ser solidárias. Um exemplo são os lanches compartilhados, em que cada aluno leva o seu e todos repartem. Existem também os jogos cooperativos, em que ninguém perde: em vez de competir, todos cooperam para a vitória do grupo.

SUBSTITUTO DO AMOR

"Em uma sociedade que pede apenas que você receba, nunca doe, a generosidade é um treino", diz a terapeuta existencial e professora da PUC-SP Dulce Critelli. Para ela, o primeiro passo para a generosidade é sacar se somos, individualmente, capazes de oferecer. "O desafio é estar atento às necessidades da vida em comum, não só às nossas." Para poder ajudar o outro, o primeiro passo é enxergá-lo, ouvi-lo, perceber suas necessidades.

Uma vez que percebemos, é hora de partir a ação. Porque ser generoso é, antes de tudo, uma escolha. É diferente, por exemplo, do amor. Quando amamos, seja um filho, seja um companheiro ou um amigo, somos capazes de grandes sacrifícios. Sem nem pensar duas vezes, uma mãe passa a noite na cabeceira do filho doente. Mas, se a criança em questão não for nosso filho, não somos capazes do mesmo gesto. Comte-Sponville pergunta: se o mendigo na rua fosse alguém que amamos, recusaríamos a ajuda que ele pede? A generosidade existe, então, como substituto do amor, para os casos em que não sentimos amor - afinal, não escolhemos senti-lo. Precisamos aprender a compartilhar com desconhecidos como fazemos com as pessoas que amamos.

Foi o que ocorreu com Sabrina Rondon Gahyva, de 24 anos, ao decidir fazer trabalho voluntário em Angola, em 2008. Jornalista, fazia trabalho parecido na periferia de Cuiabá (MT), onde mora, mas seu sonho era trabalhar com crianças carentes na África. Na internet, descobriu a ONG ADPP, com projetos no continente, e se inscreveu. Após seis meses de treinamento nos Estados Unidos, foi para Angola, onde passou nove meses.

A cidade para onde iria dar aula para crianças, Cabinda, era palco de um conflito armado, então seus planos mudaram: foi para Benguela, onde lecionou geopolítica em um curso de formação para professores da área rural. Também atuou em projetos de prevenção do HIV e em estudos sobre a inserção das mulheres no sistema educacional angolano. "Penso que o planeta é uma família só, uma corrente mesmo. E estamos aqui para trocar." Assim como os outros personagens desta reportagem, Sabrina hesita em usar o termo generosidade para falar de sua experiência. "Nisso tudo, quem mais ganhou fui eu."

RESPONSABILIDADE SOCIAL

Sabrina encontrou a ONG que viabilizaria sua ida para Angola ao navegar na internet. Pois a web é uma das ferramentas que mais podem ajudar a prática da generosidade. À primeira vista, parece que as novas tecnologias contribuem para o isolamento das pessoas. No ônibus, por exemplo, é cada um no seu canto, com seu iPod, sem conversar com o vizinho. Aqui, porém, estamos falando de outra coisa: da natureza colaborativa da rede e da cultura de participação que ela cria.

Só na internet é possível um fenômeno como a Wikipédia, em que colaboradores anônimos atualizam verbetes sobre quase qualquer assunto, tornando o site uma enorme enciclopédia global. Quando cada um faz um pouco e colabora com o que sabe, todos ganham. Assim é também com os softwares livres. São programas que poderiam custar milhões, mas foram criados por programadores que os distribuem de graça porque acreditam que a informação deve circular livremente. Uma geração acostumada a compartilhar tudo tende a ser mais generosa. "A internet maximizou os incentivos sociais que se recebe ao fazer um trabalho", diz o advogado Ronaldo Lemos, diretor do Centro de Tecnologia e Sociedade da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas e diretor do Creative Commons no Brasil. "Nessa nova visão, não importa a gratificação econômica, mas a reputação entre os pares, a capacidade de estabelecer ligações com outras pessoas, muitas delas desconhecidas."

Seja por meio da colaboração digital, seja pelas formas tradicionais de doação, o fato é que o mundo nunca precisou tanto de generosidade como nos dias de hoje. Não só com amigos, colegas, desconhecidos, mas com o próprio planeta. "Fazer o bem, hoje, é abrir mão do conforto e deixar o carro em casa de vez em quando, economizar água, reduzir o consumo", diz Dulce Critelli. Nesse sentido, a generosidade se confunde, hoje, com a responsabilidade social. "Se não aprendermos a fazer isso mais rápido do que estamos fazendo, o tecido social vai se esfacelar", diz Cortella. É preciso ser generoso com o planeta, assim como ele é conosco.

Para saber mais: Pequeno Tratado das Grandes Virtudes, André Comte-Sponville, Martins Fontes VEJA TAMBÉM: Como você exercita a generosidade?

Reportagem completa de: http://planetasustentavel.abril.com.br/noticia/atitude/conteudo_484735.shtml?func=1&pag=4&fnt=9pt

domingo, 12 de julho de 2009

Política Nacional de incentivo à leitura

Depois de lançar o Manifesto, durante a FLIP, o movimento “Por um Brasil Literário” pretende desenvolver várias ações de incentivo à leitura, sobretudo de obras literárias. Entre elas, rodas de leitura infantil em todas as escolas públicas do país e fóruns de discussão on line sobre o assunto.

Na última quinta-feira, dia 2 de julho, durante a FLIP – Festa Literária Internacional de Paraty, o movimento “Por um Brasil Literário” – formado pelas instituições Associação Casa Azul, Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil, Instituto Ecofuturo e Instituto C&A – lançou um manifesto, de autoria do poeta e escritor Bartolomeu Campos de Queirós, que fala da importância da leitura para os brasileiros.
A iniciativa foi o primeiro passo do movimento rumo a uma política nacional de incentivo à leitura, sobretudo de obras literárias, e parece ter obtido sucesso. Na ocasião, estavam presentes diversos representantes dos órgãos públicos brasileiros – entre eles, o diretor de Livro e Leitura do Ministério da Cultura, Fernando dos Santos, a secretária Municipal de Educação do Rio de Janeiro, Cláudia Costin e o secretário Municipal de Cultura de São Paulo, Carlos Augusto Calil – que aproveitaram a oportunidade para debater ações de incentivo à leitura.
Ao final do evento, a Prefeitura de Paraty já anunciou que, a partir de agosto, haverá a implantação de rodas de leitura literária em todas as escolas municipais da cidade. A ideia do Movimento é expandir a iniciativa para todos os lugares do Brasil, uma vez que o debate que aconteceu durante a FLIP definiu, claramente, que é de extrema importância manter o público infantil e juvenil em contato contínuo com o universo literário.
Além disso, o “Por um Brasil literário” colocou no ar o site do Movimento, a fim de manter organizações e indivíduos da sociedade civil informados sobre as notícias e ações de incentivo à leitura que estão sendo promovidas no país. No portal, existem ainda as seções Fórum – aonde já estão sendo discutidas diversas questões relacionadas a leitura literária no Brasil – e Participe, em que é possível assinar ao Manifesto e saber quem mais aderiu ao documento.

De corpo e alma

Guia voluntária de corredores com deficiência, Angela atrasa o passo para fazer Jéssica acelerar
Daniela Hirsch Revista Runners World - 04/2009

"Você é a guia da Jéssica?" A pergunta feita à gaúcha Angela Braunstein, de 42 anos, deixa-a feliz. E o motivo é simples: Angela faz parte do grupo de guias voluntários que participam de corridas como acompanhantes de pessoas com necessidades especiais (PNEs). E Jéssica é uma jovem de 18 anos, com deficiência intelectual e física, que adora correr.
O primeiro contato das duas aconteceu quando Angela viu a garota participando de uma prova no centro histórico de São Paulo, em 2007. Jéssica vinha seguida por uma corredora, que a orientava. Angela se interessou pelo trabalho e procurou a Fundação Orsa, responsável pelo treinamento de Jéssica.
Pouco tempo depois, a antiga guia de Jéssica pediu a Angela que assumisse seu lugar. "Poder acompanhá-la é apaixonante. O afeto e o carinho incondicionais que a gente desenvolve me deixam realizada. Nas provas, sempre largamos no meio da multidão e em muitos pontos a Jéssica recebe o apoio de quem assiste ou passa por nós", diz Angela. "É uma menina de ouro, que me dá um orgulho enorme", completa a corredora.
A responsabilidade do guia voluntário se estende além das corridas. "Eu tenho contato com a Jéssica e com a mãe dela quase semanalmente. Criamos um vínculo muito forte." Em dias de prova, a guia chega mais cedo para ajudar a colocar o chip no tênis de Jéssica, levá-la para o ponto de largada e orientá-la sobre como proceder durante a corrida. "A gente deve cuidar para ver onde ela pisa e ficar atenta para que não seja atropelada pelos que vêm atrás e não desviam", afirma a maratonista Angela, que faz seus treinos independentemente dos dias em que Jéssica se exercita sob orientação de uma técnica da Fundação Orsa.
Existem PNEs com diferentes deficiências e ritmos de prova. Como Angela está acostumada a distâncias bem maiores que sua pupila, muitas vezes, depois de deixar Jéssica em casa, dá uma esticadinha até o parque para "soltar" a musculatura. Quando Jéssica não participa de provas, Angela acompanha outros deficientes. "Hoje, o que vale a pena na corrida para mim é correr com a Jéssica aos domingos. Entrei no projeto de corpo e alma e com muito amor."
Quer ajudar?
Cadastre-se como voluntário
O Programa Voluntário Corpore (Corredores Paulistas Reunidos) existe desde 2004. "O objetivo é a inclusão social de atletas com deficiência nas corridas de rua. Temos seis categorias que são premiadas separadamente - deficiente auditivo, visual e intelectual, cadeirante, amputados de membro inferior e outros, afirma o diretor do programa, Mario Rollo. As inscrições da PNE e do guia são cortesia da Corpore.Na semana que antecede a prova, Rollo realiza uma palestra para selecionar os guias. "O corredor deve lembrar que sua função é primordial, mas ele funciona como coadjuvante", diz.
Nem sempre o guia acompanha a mesma pessoa em todas as provas, apesar de isso ser desejável. "Quanto maior a afinidade entre eles, maior a eficiência nas provas." Hoje, o programa tem uma lista de voluntários que estão "na reserva", pois o número de PNEs está menor. "Contamos com o boca-a-boca para divulgar a iniciativa entre os atletas com deficiência. Entre os voluntários, precisamos arrumar guias que sejam rápidos para acompanhar atletas mais velozes", diz Rollo.
CALCE UM ATLETA E FORME UM CAMPEÃO
Você pode dar tênis novos ou usados (em bom estado) para os atletas com deficiência. Muitos deles têm dificuldades financeiras e um tênis adequado é fundamental para prevenir futuros problemas físicos. Confira o programa “Seu tênis não pode parar”, também da Corpore, que aceita doações e as repassa para entidades que trabalham com corredores com necessidades especiais.

Bondade na berlinda


O altruísmo e a bondade estão em baixa. Hoje, a preocupação com o bem-estar do outro é mais vista com desconfiança ou como sinal de ingenuidade do que como virtude. Essa é a conclusão a que chegaram a historiadora Barbara Taylor e o psicólogo Adam Phillips, autores do livro "On Kindness" (Sobre a Bondade, em tradução livre), publicado nos Estados Unidos recentemente e ainda sem versão em português. Com informações colhidas em estudos de teoria social, psicanálise e registros históricos, eles defendem a importância do altruísmo para a construção de uma sociedade funcional, mas também mostram quanto a noção de bondade foi distorcida e hoje é mais malvista do que entendida como algo positivo. "As pessoas não se esqueceram do valor da bondade, mas perderam a confiança na habilidade própria e na dos outros de serem bons", disse Barbara à ISTOÉ. "A bondade virou sinal de fraqueza."

Rogério Skylab, músico carioca de 40 anos, é um desses desencantados. Para ele, a bondade não se encaixa na equação que rege o funcionamento da sociedade moderna. Skylab acha que o homem bondoso acaba vivendo na sombra daqueles que atropelam dilemas éticos e morais sem peso na consciência. "Hoje quem quer se dar bem tem de se afirmar em um mundo que não acolhe a ideia da bondade desinteressada", filosofa. Para os especialistas, a opinião de pessoas como o músico é fruto da derrocada ideológica e religiosa que o mundo ocidental viveu no século XX. Segundo Ari Rehfeld, professor e supervisor da clínica de psicologia da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo, os eventos marcantes entre os 100 anos que separam 1901 e 2001 gestaram uma legião de céticos. O processo de recrudescimento da desconfiança do homem ocidental começou com as promessas não cumpridas dos regimes políticos como o socialismo soviético, passou pela barbárie do nazismo e culminou com a criação da bomba atômica. "É um conjunto de situações que deixa uma mensagem bastante clara: desconfie do ser humano", diz Rehfeld.

Diante de grandes tragédias, como enchentes e furacões, que deixam milhares de desabrigados, o ser humano sabe ser solidário. Esta generosidade diluída não costuma ser questionada. É diferente, porém, quando a bondade tem um único rosto. Casada e mãe, Clarice Barata, 56 anos, é analista contábil do banco Itaú há 25 anos, onde também faz trabalho voluntário, e aprendeu a lidar com a desconfiança. "É comum acharem que eu quero ganhar alguma coisa ou que estou tirando vantagem quando me ofereço para ajudar", diz. Nesses anos todos de voluntariado, ela viu muita gente desistir do trabalho social por ter de se explicar, repetidamente, aos céticos em relação às boas intenções. "Mas é assim mesmo, quem é voluntário deve estar preparado para isso", afirma.

Um caso recente, porém, chamou a atenção até da experiente Clarice. A desconfiança veio de uma jovem de 15 anos que participa do programa "Clube do Livro", integrado por ela. Na iniciativa, o voluntário acompanha, por telefone, um adolescente na leitura de uma obra. "Entendo que ela já é moça, que tem de estar atenta aos assédios, mas fiquei impressionada com o cuidado dela em não se expor", conta Clarice. É difícil aceitar que vivemos em um mundo onde uma adolescente precisa desconfiar de uma senhora de 56 anos que quer ajudá-la. Nem por isso Clarice desanima. "Não me vejo completa e feliz de outra maneira", diz. Um estudo publicado no Journal of Research in Personality pelo professor Michael Steger, da Universidade de Louisville, nos Estados Unidos, no ano passado, confirma o sentimento de Clarice. Segundo ele, o comportamento altruísta tem mais impacto positivo sobre a percepção que o indivíduo tem de sua própria felicidade do que o hedonista, que busca a satisfação de prazeres exclusivamente pessoais.

O altruísmo teria nascido no tempo dos caçadores e coletores, 200 mil anos atrás, de acordo com uma pesquisa recém-publicada na revista científica Science. "O homem altruísta surge em um contexto de guerra constante por recursos fundamentais à sobrevivência", diz o economista americano Samuel Bowles, responsável pelo estudo. Grupos com indivíduos altruístas - que se solidarizavam com colegas que não eram necessariamente de suas famílias - tinham mais chances de vencer a disputa por uma zona de caça, por exemplo.

CÉTICO Para Rogério Skylab altruísmo não faz sentido em sistema que premia o egoísmo
Para Ruth Mace, antropóloga da University College London, o peso de uma descoberta como essa não pode ser minimizado. O homem altruís ta descrito pelo estudo de Bowles mostra que se preocupar com o outro e ser generoso pode ter sido uma vantagem evolutiva. "O estudo reabre o debate sobre a área de atuação da evolução", afirma Ruth. "Ela não estaria restrita aos genes de um indivíduo, mas também agiria no comportamento social de um grupo" diz. Em meio à crise de valores pela qual o mundo passa, a historiadora Barbara Taylor, coautora de "On Kindness", vê o momento como uma oportunidade para mudar. "Aos poucos as pessoas veem que deram valor demais ao individualismo e acabaram isoladas e infelizes", diz. Identificar o problema é o primeiro passo em direção à solução.

Notícia original no link:
http://www.terra.com.br/istoe/edicoes/2066/artigo141478-1.htm